Entre o terno e a camiseta com palavras de ordem, José Francisco Martins, de 61 anos, fica com as duas opções. Advogado por formação e militante por convicção, o bauruense já foi fiscal de zona azul, bancário, dirigente sindical e, hoje, atua na área jurídica de várias entidades representativas de classe, incluindo o Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Bauru e Região (Sinserm).
Chico da Zona Azul, como é conhecido entre os bancários em função do seu primeiro emprego com carteira assinada, passou a se dividir entre ambas as definições a partir da década de 80, quando houve a ascensão dos movimentos sindical e das Diretas Já. "A advocacia me completa como militante, porque eu consigo usar o meu conhecimento em prol dos trabalhadores", reforça.
Ainda na infância, Chico perdeu o pai, o representante comercial Francisco José Martins, vítima de um câncer no esôfago. A família do advogado, inclusive, vendeu tudo o que tinha para financiar o tratamento do patriarca, que não resistiu à doença. A mãe de Chico, a servidora pública aposentada Neuza Rosa de Oliveira Martins, de 80, precisou se reerguer rapidamente para garantir o sustento dele e dos seus outros dois irmãos, Jacqueline de Oliveira Martins, de 58, além de Jacques Henrique Martins, de 57.
O advogado é casado há 35 anos com a escriturária aposentada Izabel de Fátima Michelão Martins, de 67, com quem tem os filhos Lucas Michelão Martins, de 32, bem como Thais Michelão Martins, de 28. Lucas, por sua vez, se casou com Marisol Corvino Martins. Chico diz se sentir realizado pessoal e profissionalmente. Ao longo da entrevista, ele esmiúça o passo a passo da sua trajetória. Confira alguns trechos da conversa:
Jornal da Cidade - Você se considera um defensor da classe trabalhadora?
José Francisco Martins - Eu nunca deixei de militar neste sentido, inclusive, como advogado, afinal, participo das mobilizações dos trabalhadores e entendo que esta é a melhor alternativa para que eles tenham os seus direitos reconhecidos.
JC - Assim como milhares de trabalhadores deste País, você também começou a trabalhar cedo?
Chico - Nasci em Bauru e, aos 4 anos, me mudei para o Bela Vista. Lá, a minha família tinha uma loja que vendia de tudo: tecidos, aviamentos, presentes etc. Depois que o meu pai faleceu, um tio ajudou a minha mãe a tocar o negócio até 1976, quando ela passou em um concurso para exercer o cargo de ajudante geral nas escolas estaduais da cidade. Nesta época, eu só estudava. Aos 16 anos, consegui um estágio como fiscal de parquímetro. Logo depois, este equipamento acabou extinto e a prefeitura criou a zona azul, onde trabalhei como fiscal. Este foi o meu primeiro emprego com carteira assinada.
JC - Como a militância entrou na sua vida?
Chico - Em outubro de 1979, recém-formado como técnico em eletrônica pelo Colégio Técnico Industrial (CTI), profissão que nunca cheguei a exercer, eu ingressei no extinto Banespa, em Bauru, enquanto escriturário. Em 1984, me envolvi com o Movimento Diretas Já e, quatro anos depois, passei a atuar como dirigente do Sindicato dos Bancários de Bauru e Região, função que desempenhei até 2010.
JC - E a advocacia?
Chico - Em 1992, quando o banco começou a sofrer certa influência política rumo à privatização, eu resolvi cursar Direito na Instituição Toledo de Ensino (ITE), porque a minha experiência sindical me daria uma boa base para exercer a profissão. Em 1997, já com o meu registro junto à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), passei a advogar nas horas livres. Em 2013, depois de 34 anos atuando como bancário, me aposentei desta profissão pelo já privatizado Santander, mas dei continuidade à outra.
JC - Profissionalmente falando, em qual momento a militância e a advocacia se encontraram?
Chico - Em 1999, enquanto integrante da Michelão, Martins, Souza e Carvalho Advogados Associados, comecei a advogar para algumas entidades representativas de classe, como o Sindicato dos Trabalhadores da Unesp (Sintunesp), o Sindicato dos Químicos de Bauru e Região (Sindquimbru) e o Sinserm.
JC - Prefere ser chamado de advogado ou militante?
Chico - Embora a militância seja mais ampla do que qualquer formação acadêmica, a advocacia me completa como militante, porque eu consigo usar o meu conhecimento em prol dos trabalhadores.
JC - Todo militante tem história para contar. Gostaria de destacar alguma?
Chico - Fora a luta pela redemocratização do País, eu participei, enquanto integrante do movimento sindical, das manifestações contra a privatização do Banespa, mas, em 2000, o então governador do Estado de São Paulo, Mário Covas, entregou o banco de forma barata aos espanhóis.
JC - Tem algum hobby?
Chico - Eu gosto de viajar, jogar futebol e fazer musculação, mas precisei suspender todas as atividades em virtude da pandemia da Covid-19. Agora, me limito a caminhar diariamente e assistir a filmes.
JC - Como conheceu a sua esposa?
Chico - Em dezembro de 1981, eu a vi em um barzinho chamado Choupana, que ficava perto do viaduto da avenida Nações Unidas com a Duque de Caxias. Pouco tempo depois, descobri que ela morava a uma quadra da minha casa, porque passei pela sua residência e a reencontrei. A partir daí, nós começamos a namorar e, em 1 de fevereiro de 1986, nos casamos.
JC - Por fim, o que você aprendeu com tantas experiências?
Chico - Eu cresci enquanto pessoa e cidadão, afinal, conheço os meus direitos e nunca deixo de me posicionar diante de qualquer injustiça.