Foi durante a infância que Adalberto da Silva Retto Júnior descobriu, enquanto rabiscava traços de desenhos, que aquela atividade era o principal caminho para expressar seus sentimentos. A inspiração veio do lado artístico da avó Noemésia Cardoso Retto, carinhosamente chamada de Nenê, que também era pintora. Porém, o que ele não imaginava é que essa paixão seria o alicerce para, no futuro, conquistar uma carreira profissional consolidada na Arquitetura e Urbanismo.
Atualmente, com pós-doutorado pelo Instituto Universitário de Arquitetura de Veneza, na Itália, o professor universitário de 57 anos é coordenador do Curso Internacional de Especialização Lato Sensu em Planejamento Urbano e Políticas Públicas: Urbanismo, Paisagem, Território da Unesp de Bauru e figura como um dos grandes nomes do meio acadêmico na área por conta das várias pesquisas que já desenvolveu. Inclusive, já deu aulas como professor visitante na Universidade de Sorbonne, em Paris. Acompanhe, a seguir, os principais trechos da entrevista:
Jornal da Cidade - Pelo sotaque, percebo que não é natural de Bauru...
Adalberto Retto - Nasci em Tefé, no Amazonas. Foi uma longa trajetória para chegar em Bauru. Sempre soube que queria ser arquiteto, mas, como não tinha o curso no Amazonas e minha mãe, Marlene, não me deixou mudar de Estado, fiz agronomia em Manaus. Fiquei bastante insatisfeito quando terminei e vim estudar Arquitetura na PUC, em Campinas.
JC - E como veio parar em Bauru?
Adalberto - Em 1992, ingressei no mestrado na USP, em São Paulo, e comecei a dar aulas como professor substituto na Unesp de Bauru, indicado pela professora Raquel Rolnik. Era corrido, pois eu morava em Campinas, estudava na capital e dava aulas em Bauru, onde permaneço até hoje. Fiz doutorado 'sanduíche' na USP e decidi ir para Veneza, na Itália, ter uma experiência. Sempre tive grandes mestres na minha vida, que foram me guiando. Por isso, nunca tive medo de enfrentar desafios.
JC - Por que decidiu ficar por aqui?
Adalberto - Na Unesp, conheci o professor José Cláudio Gomes e me apaixonei pelo projeto pedagógico que ele tinha feito para o curso de Arquitetura. Ele idealizou um laboratório que visa fazer pesquisas em cidades da região e, a partir delas, gerar conhecimento para fazer proposições, planos diretores, revisões de planos diretores, de mobilidade, de turismo, de habitação, que fazem parte da competência do arquiteto. Então, isso foi o ponto central para não querer sair daqui, de onde queria dialogar com o mundo.
JC - E sua carreira no exterior?
Adalberto - Em 2000, fui para Veneza, na Itália, e isso mudou radicalmente minha vida. Foi lá que conheci o professor Bernardo Secchi, que, depois, veio para a Unesp desenvolver projetos. Minha interlocução com os venezianos continua. Inclusive, pela Unesp, vamos propor o curso "L'Italophilie: arquitetura e cidade", no qual nós vamos, de certa forma, fazer essa articulação entre o projeto pedagógico do Cláudio Gomes e essa filiação com Veneza, com a cultura italiana de análise e de projeto.
JC - Foi para outros países também?
Adalberto - Também fui professor visitante na Universidade de Sorbonne, em Paris. Essa trajetória internacional faz com que a minha compreensão do mundo seja diferente. Aprendi que projetar cidades pequenas ou grandes, como Paris, tem o mesmo grau de responsabilidade.
JC - O que viu na Europa que gostaria de ver no Brasil?
Adalberto - O Brasil carece de vivência de cidade. Lá, eles realmente vivem a cidade, aproveitam espaços abertos e parques. Mas, durante a pandemia, percebi que aqui as pessoas estão explorando mais esses locais abertos, como o Jardim Botânico, o Parque Vitória Régia. Essa reação é muito importante.
JC - Já que falou de Bauru, como valia o urbanismo da cidade?
Adalberto - A cidade foi palco de um grande entroncamento ferroviário, que foi importante para seu desenvolvimento, mas que é totalmente negligenciado e subutilizado atualmente. Além disso, outras questões que Bauru representa não são trabalhadas em políticas públicas, como o fato de ser uma cidade universitária. Os alunos são muito mais vistos como inimigos do que como atores transformadores do município. Bauru tem um potencial enorme, mas esses fatores são negligenciados.
JC - O senhor tem um projeto sobre esse assunto, certo?
Adalberto - Sim, chamado "O Centro como respublica". Pensamos em fazer uma parceria com a prefeitura e reinventar o Centro de Bauru, para que os estudantes possam morar lá e dar vida para a área. Humanizar o Centro.
JC - Como descobriu que queria ser arquiteto?
Adalberto - Todos temos formas de nos expressar e eu me descobri com o desenho. Minha avó Nenê, mãe do meu pai Adalberto, tinha um universo artístico muito desenvolvido e foi nela que encontrei cotidianamente um diálogo com aquilo que eu gostava. E, como a arquitetura tem a ver com arte, de certa forma, isso se solidificou.
JC - Para finalizar, o que o urbanismo significa para o senhor e qual o papel dele?
Adalberto - É não só modelar um espaço, mas também pensar na construção futura de uma cidade. O que me fascina na profissão é poder construir um futuro com o entendimento de políticas públicas, de sustentabilidade, vetores de desenvolvimento e entender que a cidade deve ser equânime e inclusiva.