Enfermeira de Assis da linha de frente tem COVID, sara, pede demissão e relata rotina em hospital
A enfermeira Carla Reis, que por dois meses atuou na Clínica COVID do Hospital Regional, nesta semana pediu demissão e relata ao Portal AssisCity sua experiência atuando na linha de frente contra a doença.
Carla trabalhou por dois meses na Clínica COVID, em dias alternados e em plantões noturnos de 12 horas.
"Pode parecer pouco, em se tratando de tempo, mas não é; o trabalho é altamente desgastante, pesado, pois temos que ficar em alerta para a nossa segurança e dos pacientes, não é um trabalho que possa ser mecanizado; não podemos por exemplo, servir água para um paciente sem estar com luvas e logo após é necessário jogá-las fora", pontua.
Segundo ela, o tempo que trabalhou foi suficiente para notar o quanto os enfermeiros e auxiliares de enfermagem estão esgotados.
"Junto comigo, antes de mim, e com certeza depois, haverá muitos pedidos de demissão. A rotatividade de profissionais é altíssima, pois é um trabalho extremamente desgastante. Temos que nos manter em alerta e quase que o tempo todo em pé. Quando encerramos o plantão estamos destruídos e o dia que temos para descansar ainda estamos muito desgastados e no dia seguinte você já tem que estar lá de novo, você ainda não está totalmente recuperado, mas precisa estar disposto e com toda a sua energia", considera.
"Neste tempo em que atuei na clínica vi muitos técnicos que foram contaminados lá dentro e ficaram afastados pelo tempo que precisavam, mas ninguém está seguro do vírus, ainda mais dentro de uma clínica lacrada, sem ventilação de ar para não aumentar o número de partículas circulantes e usando uma roupa grossa e com os paramentos necessários", pontua.
Enfermeira Carla Reis
Carla relata que um grande número de profissionais que atua na saúde faz uso abusivo de medicamentos para dormir, por sofrerem com insônia, e se tornam profissionais mecanizados quando já em um alto grau de Síndrome de Burnout, depressão e outras doenças incapacitantes.
"Muitos profissionais de saúde que atuaram na linha de frente no ano passado não estão mais, pois já desenvolveram algum transtorno mental ou emocional, o que é humano, e previsível", ressalta.
Carla acredita que os profissionais de saúde precisam ter um piso salarial condizente com toda a responsabilidade e entrega com a qual atuam e que deveria haver também uma redução da carga horária.
A enfermeira conta que já há alguns anos participa de cursos de inteligência emocional e que os treinamentos que possibilitam estudos em diversas áreas de desenvolvimento pessoal possibilitaram o redirecionamento de sua carreira para a área de saúde mental.
"Estou terminando uma pós-graduação em Saúde Mental e pretendo atuar de forma direta nesta área. Percebo que oferecer aos outros o meu conhecimento me trará muito mais retorno do que ficar trancada em uma sala por 12 horas seguidas", explica.
Carla conta que nos meses de quarentena, antes de iniciar seu trabalho na Clínica COVID, fez muitos cursos e participou de seminários nacionais e internacionais sobre a doença, estando muito atualizada sobre os estudos e pesquisas sobre a COVID e suas variantes.
"Quando peguei a doença no ano passado, fiquei tranquila pois já sabia os sintomas e me tratei em casa, sendo acompanhada por um pneumologista. O agravamento da pandemia que estamos vivendo já era previsto, o que não eram previstas eram as variantes; todos os médicos especialistas têm a mesma fala e eles sabem como realmente está o andamento das vacinas. Posso dizer com base em todos os cursos que participei e estudos que acompanho que a pandemia só será controlada se toda a população for imunizada. Não temos outra saída, a doença continuará sofrendo mutações, a circulação do vírus só reduzirá com a vacina, mesmo não sabendo o tempo de eficácia dela, pois ela enfraquece o vírus. Quem pegar vai ter uma gripe mais atenuada, quem já teve a COVID e se reinfectar já terá os anticorpos de memória que estarão mais atenuados também", considera.
"Neste tempo em que atuei na Clínica COVID pude notar que o vírus está vindo mais agressivo e letal, não dá chance para os pacientes como era antes; por isso e por estar mais informada sobre a doença, eu entendi o grau de risco ao qual estava sendo exposta. Meu filho é pequeno, tem apenas 7 anos e precisa de mim. Isso colaborou para a minha decisão de pedir demissão e agora, mesmo que me convidem para atuar novamente na linha frente, eu não aceitarei", conclui.