Atrasos com fornecedores, corte de mais de 3 mil consultas e retornos por mês e paralisação quase completa das cirurgias eletivas. Estes são alguns impactos de um cenário financeiro bastante delicado e que se instalou na Famesp neste início de 2021.
Após o Jornal da Cidade receber informações de que a Fundação vive seu momento mais complicado em 18 anos em Bauru, a reportagem foi até o Hospital Estadual (HE), onde foi recebida pela diretora da unidade, Deborah Maciel Cavalcanti Rosa, e pelo presidente da Famesp, Antonio Rugolo Junior. Eles confirmam a dificuldade financeira e explicam que os cortes de serviços ocorrem como forma de reequilibrar as contas.
Conforme o JC noticiou, após queda na arrecadação, o governo estadual reduziu cerca de 7% da verba destinada às Organizações Sociais de Saúde (OSS) e 12% dos recursos repassados às santas casas.
Com isso, o desfalque nos contratos da Famesp, que é OSS, deve alcançar até R$ 24 milhões anuais, segundo dados do Portal da Transparência do Estado. Em Bauru, a Fundação responde pela gestão do HE, Hospital de Base (HB), Maternidade Santa Isabel e Ambulatório Médico de Especialidades (AME).
A queda no orçamento somada aos R$ 8,8 milhões bloqueados judicialmente significam que a Fundação tem até R$ 32,8 milhões a menos em 2021. "A Famesp se descapitalizou para fazer frente às despesas desse bloqueio", confirma Rugolo.
ATRASO A FORNECEDORES
Como efeito, a Fundação teria atrasado até R$ 2 milhões em contratos com fornecedores de medicações, seringas, marca-passos e EPIs contra a Covid-19. A situação, inclusive, foi descrita em petição feita à Justiça, na ação que cobra a abertura dos leitos no HC. No documento, a Famesp demonstra receio sobre a reposição de produtos hospitalares em razão da inadimplência e pede a liberação da verba bloqueada.
Dos contratos atrasados, R$ 1 milhão havia sido pago até a última semana. O restante ainda é negociado.
REDUÇÃO E PRESSÃO
Diante do corte orçamentário, os hospitais foram os que mais sofreram. No HE, há R$ 1,5 milhão por mês a menos, e, no Base, a redução é de R$ 700 mil, conforme o Portal da Transparência. "Em comum acordo, as direções dos hospitais sentaram e definiram o que cada um conseguiria reduzir", pontua Rugolo.
E, como ambos atendem a região, entre 18 e 38 municípios - que também já sofrem com redução de verbas nas suas santas casas - são pressionados.
A pandemia já havia reduzido atendimentos no HE, mas cerca de mil cirurgias eletivas ainda eram feitas por mês. "Em janeiro, fizemos 500, mas a ideia, agora, é zerar", comenta a diretora Deborah Maciel, exemplificando cirurgias de hérnia e amigdalectomia. "Ficarão apenas cirurgias de maior complexidade, como câncer e de próstata", explica a diretora.
Por lá, as consultas também caíram de 1,8 mil para 1,3 mil, neste ano. E os retornos das consultas reduziram de 6 mil para 4 mil por mês. "Os municípios terão que assumir e acompanhar o paciente na atenção básica. Ainda não começamos o processo de alta médica, porque estamos alinhando e ajudando municípios na capacitação. Mas, o Hospital Estadual, agora, atenderá casos em que o especialista for realmente necessário", alerta a diretora.
Já o Base, que recebe quase todo o contingente de atendimentos não-Covid, está com redução de mais de 70% das cirurgias eletivas. O número de consultas também caiu demasiadamente no HB, mas a Famesp não forneceu os dados.
A situação é tão complexa que, se a pandemia acabasse hoje, a presidência da Famesp não nega que os pacientes à espera de cirurgia eletiva continuariam sem operar, por falta de recursos.
Com 350 partos por mês, a Maternidade Santa Isabel é o único hospital em que os atendimentos não caíram, mesmo diante do corte de 3% (R$ 103 mil) no orçamento, que é de R$ 3 milhões. A Famesp, contudo, viria arcando com um déficit de quase R$ 400 mil mensal para funcionamento da unidade.
Segundo o JC apurou, isto ocorreria em razão de um passivo, com início em 2020, da Maternidade junto à Fundação. Na ocasião, o número de UTIs Neonatal foi ampliado de 10 para 17 leitos, no entanto, não houve aumento no custeio para bancar a expansão, que sairia por até R$ 300 mil ao mês.
No ano passado, a Famesp chegou a cogitar até a entrega da gestão Maternidade em documento enviado à Saúde estadual. Ainda assim, segundo o JC apurou, o impasse continua e a negociação segue em andamento.